quarta-feira, 30 de novembro de 2011

Cientistas brasileiros criam vacina para câncer

Cientistas brasileiros criam vacina para câncer com protozoário da Doença de Chagas
Versão atenuada do 'T. cruzi' foi modificada geneticamente para produzir molécula igual à do tumor e fazer o sistema imunológico atacar o câncer.

Descoberto em 1909, o parasita Trypanosoma cruzi é o causador da doença de Chagas, que afeta entre 12 e 14 milhões de pessoas na América Latina. O autor da descoberta, o sanitarista Carlos Chagas, foi indicado duas vezes ao prêmio Nobel pela importância do achado. Agora, 100 anos depois, o parasita pode proporcionar outra importante descoberta: cientistas da Universidade Federal de Minas Gerais estão usando o parasita para criar uma vacina contra o câncer.

A pesquisa brasileira já apresentou resultados satisfatórios em testes com ratos e acaba de ser publicada na edição desta semana da revista americana PNAS (Proceedings of the Nacional Academy of Sciences), o que deve atrair financiamento para a continuação do trabalho e futuros testes em seres humanos.
Os pesquisadores fizeram uma modificação genética em uma cepa atenuada (incapaz de desencadear a doença) do T. cruzi, fazendo com que o micro-organismo produzisse um certo antígeno igual ao que é fabricado pelas células do câncer de pele: o NY-ESO-1. À diferença do tumor, o T. cruzi produz uma resposta imunológica muito rápida no corpo. "Os anticorpos passam a atacá-lo e destruí-lo. Como ele contém esse antígeno produzido pelas células tumorais, o sistema imunológico entende que deve atacar e destruir as células com câncer", explica ao site de VEJA Ricardo Gazzinelli, coordenador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Vacinas e orientador da tese de mestrado da cientista Caroline Junqueira na UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), onde o estudo foi desenvolvido. Como o protozoário costuma permanecer no corpo de forma crônica, a vacina pode ter efeito duradouro.

O sucesso dos testes foi parcial no tratamento de camundongos já infectados com o câncer de pele, ou melanoma. Já as cobaias que receberam a vacina antes de os cientistas induzirem a formação do tumor não desenvolveram a doença. "O resultado foi muito promissor", afirma Gazzinelli. "Mas continuamos trabalhando para aumentar a taxa de sucesso nos casos de cobaias doentes."

O T. cruzi modificado também foi testado em células humanas cancerígenas mantidas em laboratório e provou ser eficiente em paralisar o crescimento da doença e diminuir o tamanho do tumor em vários casos. Os pesquisadores acreditam que podem aumentar a abrangência da vacina inserindo mais de um tipo de antígeno, para combater mais tumores e não apenas o melanoma.

Os próximos passos da pesquisa são os testes com cachorros. "Nos cães, vamos aplicar vacinas polivalentes, com quatro ou cinco antígenos. Esse é um passo importante na pesquisa", explica Gazzinelli. Com cinco antígenos, o pesquisador acredita que pode impedir a formação de 90% dos tipos de cânceres que afetam humanos. "Outro ponto importante é trabalhar para aumentar a segurança do tratamento. Apesar de não termos tido nenhum camundongo infectado com Chagas, essa é uma abordagem inédita e há uma resistência da comunidade científica em usar um protozoário que causa uma doença grave como fonte para uma vacina", completa.

A possibilidade de se realizar testes em seres humanos ainda está distante, mas os pesquisadores estão otimistas e comemoraram a publicação do estudo na revista americana, uma das mais influentes do mundo. "Mostra que estamos no caminho certo e que o estudo foi feito com a seriedade necessária. Precisamos ter cautela neste momento, mas acredito que, se os resultados persistirem nos próximos testes, essa pode ser uma descoberta muito importante."
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